sábado, 14 de abril de 2007

Retrato de família com armário e pintura chinesa contemporânea

(Cay Yi Lin, 2005)

Nos tempos da revolução tive uma blusa
caqui bordada a ponto aberto. Cintada e

justa, ao fim de dois ou três anos de intenso
uso não me servia. Mas pendurada ficou

por muito tempo ainda no armário,
antes que a contragosto me decidisse

a dar por findo o gosto que nela tinha.
Que não era alegórica prova-o o facto

de me ocorrer, de quando em vez, pensar
por alto: “onde estará o verão de antanho?

Em que lugar o teu olhar
me perseguia?

Em que gaveta guardo o silêncio
que me despia?”

E analiso longamente o meu armário.

Se eu dissesse que sou filha da revolução
a minha mãe não iria gostar.

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