Retrato de família com armário e pintura chinesa contemporânea
(Cay Yi Lin, 2005)
Nos tempos da revolução tive uma blusa
caqui bordada a ponto aberto. Cintada e
justa, ao fim de dois ou três anos de intenso
uso não me servia. Mas pendurada ficou
por muito tempo ainda no armário,
antes que a contragosto me decidisse
a dar por findo o gosto que nela tinha.
Que não era alegórica prova-o o facto
de me ocorrer, de quando em vez, pensar
por alto: “onde estará o verão de antanho?
Em que lugar o teu olhar
me perseguia?
Em que gaveta guardo o silêncio
que me despia?”
E analiso longamente o meu armário.
Se eu dissesse que sou filha da revolução
a minha mãe não iria gostar.
caqui bordada a ponto aberto. Cintada e
justa, ao fim de dois ou três anos de intenso
uso não me servia. Mas pendurada ficou
por muito tempo ainda no armário,
antes que a contragosto me decidisse
a dar por findo o gosto que nela tinha.
Que não era alegórica prova-o o facto
de me ocorrer, de quando em vez, pensar
por alto: “onde estará o verão de antanho?
Em que lugar o teu olhar
me perseguia?
Em que gaveta guardo o silêncio
que me despia?”
E analiso longamente o meu armário.
Se eu dissesse que sou filha da revolução
a minha mãe não iria gostar.