quinta-feira, 22 de março de 2007

O inventário


Disciplinado e atento como sempre, um jovem
duende procedia à meticulosa tarefa de
inventariar os pessegueiros. Dispunha para tal
de um formulário, com vinte e cinco alíneas,
cada uma a preencher expressamente
e na língua dos nativos e na língua dos duendes.

Nelas constavam: a cor, o nome, a espécie, a sombra
(amena, ou frondosa, ou rendilhada, ou) a música
das folhas, o movimento, o lugar, o estado, a origem
das raízes e do tronco, o das flores e dos botões (quando
aplicável), juntamente com a fauna, humana ou
animal, que, fugaz ou permanente, o frequentava.

Nas outras doze alíneas deveria,
por ordem decrescente, descrever
os doze melhores ramos
(anexando um breve esquisso ou aguarela).

Num país de pomares e de colinas
a tarefa prometia a eternidade. Mas eterna
era a paciência do duende, pelo que,
cinco mil cento e quinze pessegueiros
constavam já, perfilados, do inventário.
Parou, pois, o jovem duende, por momentos,
na sombra de um pinheiro ao pé da estrada.

[… aqui se indica o breve sono do duende]

Esta história não tem, eventualmente, um fim
visível. E quer o duende acorde ou quer floresça.

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